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A melodia da ost do filme que tinha dominado a cabeça dela tocava suavemente em seus ouvidos devido ao fone que usava. As íris acinzentadas encaravam o caminho à sua frente de forma apática, não recebendo nenhuma emoção mesmo diante do familiar ponto de ônibus.
Como de rotina, Nico Robin tinha acabado de sair do trabalho. A escola em que dava aula ficava a, literalmente, uma esquina daquele local — o que facilitava uma viagem mais rápida para sua casa, ainda que fosse através de um transporte público.
Distraída, a professora acenou, como de costume, para a mulher de cabelos azulados que estava sentada no banquinho antes de fazer o mesmo. Tal como ela, a outra também parecia ter uma agenda bem definida, transformando-as assim em conhecidas do ponto de ônibus.
Logo, já era habitual que Robin a cumprimentasse — na maioria das vezes com um pequeno sorriso no rosto, tendo a gentileza erguendo os cantos de seus lábios — ainda que nunca tivesse trocado palavras com ela. Não chegava a ser algo desconfortável para Nico, pois sendo uma pessoa introvertida e com baixo conhecimento social, ela se considerava péssima para fazer conversas rápidas ou superficiais.
E, como já era praxe, não demorou muito para seu ônibus chegar. Robin levantou do banco e fez sinal, subindo no veículo logo após, com a intenção de seguir seu rumo.
Apenas mais um dia normal, em que ela, já de rotina, continua completamente alheia à expressão de frustração que está estampada no rosto da mulher de cabelos azuis.
[—]
Nico Robin odiava quando algo saía fora do que era esperado por si. Por isso, não era surpreendente que se sentisse confortada com sua agenda, mesmo que ela fosse levemente caótica.
Ainda assim, no momento em que sentiu alguém tocar-lhe o ombro enquanto esperava por seu ônibus no ponto, ela não conseguiu sentir nada além de uma breve surpresa e curiosidade.
No instante em que suas íris acinzentadas se focaram na face determinada da moça familiar, ela soube que o dia não seria o roteiro habitual. Ao invés disso ser algo ruim, porém, Robin se surpreendeu quando viu a outra mulher começar a gesticular.
Franzindo as sobrancelhas, Nico percebeu que alguns sinais não eram tão desconhecidos como imaginava. Aquele forma de apontar o dedo indicador com o do meio juntos — não era aquele o gesto que estava relacionado com a palavra nome em libras?
— Peço perdão, mas não consigo ler a linguagem de sinais — a professora disse de forma calma, enquanto retirava um de seus fones sem fio da orelha.
Ela viu quando a expressão de choque no rosto da sua "parceira de ponto" se transformou em vergonha, o vermelho florescendo nas bochechas da moça enquanto ela tampava os lábios com uma de suas mãos.
— Santo Nika, você não é surda! — a jovem exclamou, surpresa e embaraçada. Os olhos dela ainda estavam arregalados enquanto ela falava, com a voz instável e nervosa. — Me desculpa, eu– céus, me sinto tão idiota!
Diante a reação da moça, Robin não conseguiu fazer nada além de encará-la. O choque perante ao que tinha escutado a deixou imóvel momentaneamente, fazendo-a deixar a outra continuar monologando em desespero.
— Achei que você fosse surda, sabe, porque– bem, eu sempre tento falar contigo e você nunca me responde — assim que ela comentou isso, o nervosismo da mulher de cabelos azuis pareceu aumentar novamente, fazendo-a balançar os braços à sua frente em uma tentativa de suavizar uma possível grosseria. — Não que você fosse obrigada, claro. Também, com os fones, que não dá pra ver que você está usando, não acho que daria pra me escutar de qualquer jeito.
O vermelho ia se esvaindo do rosto da jovem, o desespero sendo substituído pelo nervosismo e a frustração. Ambos os sentimentos forçavam os lábios da não tão desconhecida a tremerem, trazendo um ar mais triste à expressão dela que era salientada pelo brilho aquoso em seu olhar.
— Aí, como eu pensei que fosse surda, acabei tentando aprender um pouco de linguagem de sinais para poder tentar falar contigo… — a outra finalizou seu discurso ansioso, em um tom mais baixo e desanimado do que o qual havia começado.
Era óbvio que ela tinha certeza que havia causado uma péssima impressão para a Nico, e que isso a estava deixando sem graça e desiludida.
Embora a professora tivesse sentido uma leve pontada no peito ao ver a gentil mulher daquela forma, ela não conseguiu prender a risadinha divertida que lhe tomou ao finalmente assimilar a situação.
— Wow, nunca pensei que fosse digna o suficiente para aprenderem linguagem de sinais para falarem comigo — Robin disse, com um tom divertido, antes que a situação ficasse pior. Ela ainda estava surpresa, assim como sentia um calor consumir seu corpo, com o fato de sua "parceira de ponto" ter feito algo tão legal por ela.
— Me desculpe mesmo pela confusão — a jovem falou, novamente num tom tímido. Ao observar o rosto dela com um pouco mais de atenção, Nico viu que as bochechas alheias estavam levemente rosadas. — Tem algum jeito de me retratar contigo?
Normalmente, a professora apenas diria que não existia motivo para se desculpar e que estava tudo bem antes de seguir com sua rotina. Todavia, não só o motivo de sua interação com a outra mulher tinha sido agradável, ela agora estava curiosa sobre várias coisas referentes ao que levou a moça a agir assim.
Por isso, Robin pôs o indicador na bochecha e inclinou a cabeça levemente para o lado, pensativa. Vendo a forma retraída da jovem, ela não demorou muito a tomar uma decisão enquanto fazia um som questionador.
— Bom — Nico iniciou, tentando soar gentil. Ela não queria parecer que estava forçando a outra a fazer algo em troca de um perdão sem motivo. —, você poderia, se não for problema, me acompanhar para um café para começar.
Ela ouviu o ofego da moça e viu a forma como os lábios dela se ergueram em um pequeno sorriso.
— Afinal, não é todo dia que a gente tem a oportunidade de saber mais sobre a mulher que aprendeu linguagem de sinais por uma que não sabia lê-la — a professora comentou, levemente acanhada e feliz com o fato.
— Eu também adoraria conhecer mais sobre você! — E, mesmo que ela não tivesse dito nada, a professora sabia que aquilo era verdade. Pois a forma como os olhos dela brilharam quando a chamou para um café tinham dito tudo o que a Robin precisava saber.
[—]
Um suspiro cansado escapou Nico. Aquela semana tinha sido cansativa para ela, de forma que apenas desejava chegar em casa e relaxar lendo um de seus livros favoritos enquanto bebericava uma xícara de chá.
No momento em que avistou o familiar ponto de ônibus, seus lábios automaticamente se ergueram em um singelo sorriso. Ela retirou um dos fones da orelha, podendo assim novamente ouvir o barulho dos veículos passando pelo asfalto e vários murmúrios não compreensíveis.
Conforme ela foi chegando mais perto do local, porém, sua atenção foi captada pelo cantarolar — não tão baixo — de uma voz bem conhecida por si.
— Senhorita Nefertari — Robin cumprimentou a mulher de cabelos azuis, trazendo as íris castanhas dela para sua pessoa.
Assim que Vivi lhe viu, ela se levantou, com uma expressão animada — para então franzir as sobrancelhas ao perceber a forma como a professora tinha lhe chamado.
— Você realmente não vai deixar essa de lado, né.
— Não é todo dia que você descobre que a filha do embaixador de Alabasta prefere pegar o ônibus a andar de limousine.
A Nefertari apenas revirou os olhos diante do que escutou.
— E eu achando que você queria a minha companhia — a outra reclamou, fazendo um falso biquinho nos lábios, obviamente brincando com Nico.
A professora soltou uma pequena risadinha.
— Me perdoe, não quis irritar você.
— Não tem problema… renomada arqueóloga de Ohara — Nos lábios de Vivi agora dominava um sorriso travesso, deixando-a tão parecida com a chefe dela que fazia Robin ficar boba pela forma leve que a jovem se portava com sua pessoa.
— Tem certeza que sou eu quem não quer ter um jantar romântico essa noite? — Ela ergueu uma sobrancelha de forma questionadora. Ignorando como seu coração estava acelerado, Nico observou a forma como as bochechas de Nefertari se avermelharam levemente.
— Um jantar? — a moça de cabelos azulados repetiu, parecendo mais alheia do que confusa.
A professora apenas assentiu calmamente. Poucos segundos depois, o brilho animado estava presente nas calorosas íris castanhas de Vivi.
— Mas pensei que não gostasse de comer em restaurantes — a jovem comentou, voltando a se aproximar de Robin.
— Talvez eu tenha o número do Baratie e conheça um dos chefs principais — Nico disse, não perdendo tempo em segurar a mão de Nefertari assim que a outra se pôs ao seu lado.
— E eu achando que você ia cozinhar pra mim — Vivi brincou, fingindo uma falsa tristeza. A fala facilmente fez ambas rirem, afinal, ela já tinha conhecimento da falta de habilidade da professora na cozinha.
Quando elas se acalmaram, uma pequena troca de olhares aconteceu. Já fazia alguns meses desde que a moça de cabelos azuis havia se envergonhado na frente de Robin, e ainda era surpreendente como Nefertari se sentia besta por poder agora chamar a bela moça do ponto de namorada.
Não resistindo a estar tão perto de Nico sem fazer nada, Vivi roubou um rápido selinho da outra. Mesmo surpresa com o gesto, não demorou muito para o rosto da professora ganhar um tom rosado.
Era tão fofinho como ela ficava sem jeito quando a filha do embaixador era carinhosa.
— Devo tomar isso como um sim? — Robin questionou, ainda sem sair da brincadeira, embora seu tom continuasse calmo.
Um sorriso brilhante dominou o rosto de Vivi.
— Mas é claro que deve.