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Diferente de outras aristocratas, a princesa de Jade não era estúpida. Se existia a necessidade de casar com alguém por conveniência, que assim fosse. Talvez pensasse dessa maneira porque tinha virado órfã cedo, ou pelo fato de ter sido adotada pela realeza quando antes era uma mera plebeia — a questão é que Harumi nunca pôs o amor como um objetivo importante a ser alcançado. Se fosse sincera, ele sequer passava pela sua cabeça.
Logo, quando seus pais começaram a falar sobre companheiros, formar uma nova família, um novo bando… bem, digamos que já sabia onde aquela conversa iria parar. E, diferente do que esperavam de uma garotinha mimada, ela apenas sorriu rigidamente e perguntou o que tinham planejado para sua adorada herdeira.
Ter a opção de escolher com quem ficaria da lista de pretendentes que fizeram era apenas um dos privilégios de alfa que tinha. O Spin-Mestre bem sabia como ômegas sofriam mais com todo esse negócio de casamento. E, sendo alguém inteligente, Harumi obviamente selecionou uma pessoa que não só agradasse seus pais, como também pudesse lhe servir para seus futuros planos.
E foi assim que Nya Smith, princesa do Reino de Ferreiros, recebeu uma carta com o seu pedido de noivado.
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Surpreendendo a ninguém, a resposta chegou poucos dias depois. Por causa do novo sistema de correios mágico, mesmo que sua futura esposa morasse longe, (o que era um fato verídico) as cartas não iriam demorar mais do que uns três dias para chegar ao seu destinatário. Receber o documento oficial que confirmaria o casamento durante o seu café da manhã seria um ótimo jeito de começar o seu dia.
Tudo está indo conforme o esperado.
— Oh, a princesa Nya está requisitando um mês de cortejo aqui no Reino de Jade antes de prosseguir com o noivado — A rainha comentou animadamente, tendo suas irises negras ainda cravadas no papel que segurava.
O sorriso estampado no rosto de Harumi murchou.
— Perdão?
— Parece que ela não vai aceitar o pedido enquanto não houver o período de cortejamento — Dessa vez foi o rei quem falou, observando a carta pelos ombros de sua esposa. Ele segurava sua xícara com café ainda fumegante, todavia toda a sua atenção estava na folha que ainda estava nas mãos de sua ômega.
Bem, nem tudo está indo conforme o planejado. Parece que temos uma princesinha estúpida na questão…
Ao invés de compartilhar com seus pais sobre sua opinião, a princesa de Jade apenas suspirou. Não faria o menor sentido fazer drama porque encontrou uma pequena pedra no seu caminho. Por isso, a única resposta que deu perante a exigência da Smith foi um simples:
— Se é o que ela deseja, então assim será.
Com seus… pais satisfeitos com o que disse, Harumi voltou a comer. Ela não poderia deixar-se levar pelo sentimento de irritação, tinha de se manter elegante e educada. Aquilo não significava que seus planos estavam arruinados, mas sim que seriam… atrasados. Era uma questão de saber como jogar; se fizesse direitinho, talvez até mesmo conseguisse muito mais do que desejava.
Enquanto mastigava o delicioso croissant recheado, a princesa de Jade começava a planejar como cortejaria a ômega… para poder se casar com ela por conveniência. Não deveria ser tão difícil assim, já que conhecia diversos alfas que conseguiam fazer aquele tipo de proeza. E se estúpidos príncipes não tinham problema com aquilo, não seria Harumi que iria ter.
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A princesa de Jade quase ignorou completamente as ideias que tinha arquitetado quando viu, pela primeira vez, a sua futura noiva. O pano azulado e pesado do kimono envolvia a ômega, fazendo com que parecesse menor do que realmente era. Seus cabelos negros eram medianos, as mechas batendo na linha do maxilar bem definido que a jovem tinha, enquadrando o rosto dela de uma forma bela.
Irises âmbares observavam o salão real de visitas, tendo um brilho curioso e um contorno analista no olhar. Mesmo de longe, Harumi conseguia ver a pequena pinta que existia embaixo do olho direito da princesa de Ferreiros, um detalhe que não sabia dizer se era real ou feito por maquiagem.
Para a sua sorte, no entanto, todo o seu encanto com a beleza de sua futura noiva só durou enquanto esta se manteve calada.
— O que você realmente quer desse casamento? — A voz, surpreendentemente grave, era agradável de se escutar, ao contrário das palavras que esta tinha dito. A princesa de Jade fez a sua melhor expressão surpresa, entretanto pelo revirar de olhos que a ômega deu, sua atuação não foi muito crível. — Nunca te vi nos festivais de acordos pacíficos, muito menos escutei falar que a herdeira de Jade estava interessada em romances.
Ignorando o olhar desesperado de suas servas, Nya se aproximou da alfa, a encarando de forma analítica. A expressão dela não mostrava nenhuma emoção, ao contrário de Harumi, que não sabia se era confusão ou irritação que estava mostrando em sua face.
— Logo, só consigo pensar em duas razões para você ter feito esse pedido: ou você quer agradar seus pais escolhendo um reino onde o poder deles ainda não é influente ou você pretende usar dessa aliança para fazer alguma jogada de poder.
A princesa de Jade soltou uma risadinha, torcendo para que soasse nervosa e não incomodada.
— E não te passou pela cabeça, talvez, que eu pudesse ser tímida com as minhas afeições? — Mesmo usando a voz mais gentil e delicada, a expressão da ômega não modificou. Suas irises âmbares se intensificaram ao analisá-la, não parecendo nem um pouco tocada pela tentativa de Harumi.
— Você não me parece ser do tipo que permitiria que suas emoções ficassem no caminho de seus objetivos — Nya comentou, num mesmo tom de quem faz uma observação sobre o tempo. O coração da alfa se acelerou, uma reação estranha para si, principalmente por ter vindo acompanhada de um calor que inundou o seu corpo em chamas.
A princesa de Ferreiros seria uma adversária difícil de conquistar. Ter essa realização, porém, não trouxe a irritação que estava sentindo desde que havia sido acusada pela outra. O sentimento que a dominava agora era confuso, a deixava inquieta e parecia querer forçá-la a tomar uma atitude. Sua pele formigava, a compelindo para fazer algo; o quê, exatamente, ela não tinha ideia.
Todo esse misto de emoções todavia não impediram Harumi de abrir um sorriso satisfeito.
— Fala como se me conhecesse, acusa-me como se tivesse todas as provas, e ainda assim aceitou vir ao meu reino para prosseguir com o cortejamento — Ela começou, soando levemente ofendida e curiosa. Não percebeu como sua mão foi parar no rosto macio da ômega, no entanto, não hesitou em acariciar a pinta dela com o seu polegar. Ainda que o olhar de Nya não vacilasse, era óbvio como ela estava tensa em receber um toque tão gentil. — Posso questionar o porquê disso?
— Eu queria saber se iria aceitar.
A princesa de Jade ergueu uma sobrancelha, pedindo para que a outra prosseguisse apenas com aquele gesto. Suspeitava que aquele não era o único motivo.
— Também precisava descobrir o que você está planejando — A princesa de Ferreiros continuou, apoiando-se brevemente na mão que segurava seu rosto, antes de retirar a palma de Harumi de sua pele. — E agora desejo saber até onde pretende ir com isso.
Os murmúrios das servas já estavam incomodando os ouvidos sensíveis da alfa, todavia ela manteve a sua atenção na jovem a sua frente. O desafio na fala de Nya era óbvio, e Harumi não via outra opção além de aceitá-lo. Se estava fazendo isso por seus planejamentos ou porque queria provar que conseguiria, era algo que não poderia dizer com honestidade.
A princesa de Jade não hesitou em pegar a mão da ômega, a trazendo o mais perto possível de seu rosto.
— Onde mais eu pretenderia ir? — Questionou com um tom sedutor, selando seus lábios no dorso alheio. O suave cheiro adocicado era inebriante, solidificando que havia escolhido sua noiva com excelência. — Iremos até o altar, querida.