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O tecido suave do pano estava ficando puído, no entanto, Yuyu continuava a passá-lo no metal. Ele deslizava pelo charm com a ajuda da cera, o lustrando lenta e consistentemente; quase que numa carícia. A ação repetitiva impedia a Shirai de distrair-se com pensamentos desnecessários, deixando-a focada na sua tarefa.
Ainda que… ela não estivesse mais por ali para poder elogiá-la pelo bom serviço, a lily não conseguiria deixar aquela arma juntar poeira em um armário qualquer. E muito menos sentiria-se bem em ver outra usando do Brionic como se este nunca tivesse tido uma dona.
Sabia que era egoísmo seu. Não que fosse surpreendente, Yuyu era uma pessoa egoísta afinal. Ainda assim, ela não conseguia simplesmente deixar Moyu retirar o charm de seus dedos mornos. O fato do objeto ser uma arma pouco importava para si, aquilo era uma das poucas coisas dela que tinha conseguido guardar além de suas memórias.
A Shirai inspirou, deixando o ar cálido que entrava pela janela preencher os seus pulmões. Ela não sabia que horas eram, se era manhã ou noite, quantas refeições tinha perdido. Nada disso importava enquanto estivesse com a ponta de seus dedos na superfície gélida do metal. O frio que vinha do charm a mantia estagnada no agora, apesar de estar rodeado de lembranças.
Yuyu não poderia estar presa no momento em que perdeu Mizusu se estivesse ocupada demais limpando o Brionic. Ela não teria como se perder entre fragmentos de recordações; não veria flashes de mechas acinzentadas esvoaçando pelo vento acima de si, não iria sentir ânsia por um toque acalorado em sua bochecha que não mais poderia ter, não sentiria seus lábios formigando por um beijo que sequer tinha sido depositado ali.
A ardência em seus olhos começou a doer, fazendo com que a Shirai percebesse que tinha parado de mover o pano sobre a superfície metálica já brilhante. Isto porque seu braço estava parado, pois se dependesse de sua visão borrada, sequer entenderia o que estava acontecendo.
Foi com um aperto incômodo e sufocante no peito devido ao desespero que Yuyu agarrou o tecido novamente, desejando ardentemente que pudesse voltar ao seu estado mental inerte. Entretanto, mesmo que estivesse o segurando, ela não conseguia se forçar a mexer a mão.
O que a impedia de voltar a limpar aquela arma? Talvez estivesse fingindo não saber. Naquele momento, sequer tentou pensar sobre os possíveis motivos. Não, a dor era tanta em seu coração rachado que nem conseguia pensar. O som que tocava em loop na sua cabeça era semelhante a um rugido de um Huge, e o cheiro que inundava seu olfato era metálico e decomposto.
Uma lamúria agoniada escapou de sua garganta, fazendo com que a Shirai encolhesse os ombros; com a intenção de se esconder de uma criatura que não estava ali em seu quarto em Yurigaoka, e sim presa dentro dos cantos obscuros de sua mente. Ela sentiu um líquido quente escorrendo por seu rosto, todavia suas irises púrpuras não conseguiam enxergar ainda — estavam muito nubladas para a deixarem ver o que realmente acontecia.
Não que desejasse voltar para a realidade. Afinal, não mais tinha a única pessoa que considerava especial para si. Se essa era a sua nova verdade, Yuyu não sabia se queria viver.
— Onee-sama…
As lágrimas que deslizavam pelas bochechas da Shirai caíam no metal do charm, acumulando-se lentamente conforme a lily despejava a sua tristeza. E ali ficariam até que a jovem pudesse voltar a limpar o Brionic, começando assim novamente o seu ciclo de luto.