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Summary:

Com as pernas trêmulas, ela tentou se fincar no chão terroso e desuniforme, para então começar a afastar as costas do seu apoio. Assim que se percebeu em pé, ela abriu os olhos e se deparou com uma escuridão levemente semelhante com a de um cômodo sem iluminação. Se ela conseguia ver um pouco do caminho e de algumas plantas, era por causa da lua que brilhava com intensidade e solidão no céu, já que aquela era a única luz que existia por ali. Nem mesmo as estrelas pareciam estar acompanhando a tragédia que aconteceu com a descendentes dos Wolf.

Tensionando os lábios para impedir-se de fazer algum som, ela deu um passo pra frente. A náusea subiu pela seu pescoço e se firmou no fundo da garganta, e pontinhos negros dançaram pela sua visão quando o calor em seu ferimento aumentou, fazendo a dor escalar pela lateral do seu corpo. A pressão em seu peito retornou, a forçando a abrir a boca, numa tentativa de colocar ar para dentro dos seus pulmões sufocados. Mesmo com tudo isso que se passava pelo seu corpo, Ramona deu mais um passo à frente.

Notes:

o tema que estou usando é encontro, dia 4 (nem um pouco atrasado) !! e não, não estou roubando ;p

eu amo essas duas, o relacionamento delas tem a dose perfeita de angst e comforto, então é óbvio que eu precisava escrever algo sobre elas. eu tinha começado essa, antes apenas terminei — tava na hora já também — e agora estou postando !!

(See the end of the work for more notes.)

Work Text:

O líquido pegajoso que escorria pelos seus dedos era quente. A pressão que fazia na lateral do seu corpo com as mãos não tapava o seu ferimento acima do quadril. O aperto no peito que lhe causava falta de ar era diferente das pontadas de dor que sentia no abdômen, que pareciam se espalhar pelo resto do corpo. Ramona arfava, com bastante dificuldade; ela sentia a textura áspera do tronco roçando na sua camisa de linho fino, por pouco não encostando na pele dos seus ombros. Sua visão estava embaçada, de forma que só conseguia ver borrões vultosos de tonalidades tenuamente diferentes — suspeitava que estava olhando na direção das folhas da árvore que se apoiava, já que seria a única coisa que faria sentido naquele momento.

Tinha acontecido a poucos minutos. Ainda assim, ela não conseguia acreditar que tinha sido traída por alguém que tivera considerado ser sua amiga. Como ambas eram escudeiras, não deveria ter surpreendido-na que sua rival teria feito aquilo para lhe tirar da jogada. E, mesmo assim, Ramona não esperava que a outra teria tentado a assassinar de forma tão cruel. Se a lâmina da adaga que a Cristina usou tivesse sido mais afiada, com certeza a tentativa teria dado certo.

Como ela tinha escapado — se é que foi isso que aconteceu —, já não lembrava mais. Depois do choque que teve, os acontecimentos entre o golpe que recebeu e a chegada naquele ponto da floresta eram apenas borrões incompreensíveis em sua mente. Apesar do cheiro metálico forte, Ramona também conseguia identificar um suave aroma adocicado que conseguia reconhecer como o da flor de gladiolus . A cada momento que inspirava com dificuldade, a pressão em seu peito diminuia de forma sutil; isso a fazia sentir mais a dor que provinha do seu ferimento, trazendo lentamente o foco de volta para si, de forma que agora conseguia escutar os batimentos acelerados ressoando em seus tímpanos.

Não sabia como tinha chegado naquele ponto, no entanto, tinha certeza que só precisava andar mais um pouquinho e logo estaria segura. Aquele perfume era bastante familiar para si, tendo em vista a quantidade de vezes que o inalou e apreciou quando visitou uma certa feiticeira ranzinza. Kathrina poderia até ser rude e orgulhosa com as pessoas que tentavam a conhecer, porém isso não significava que ela era uma pessoa ruim — a quantidade de vezes que tinha visto ela ajudar, ainda que contrariada, quem se aproximava dela tinham sido mais que o suficiente para ser incapaz de contar com os dedos da mão e dos pés.

Em meio a dor, a tensão e a incerteza se conseguiria chegar até a casa alheia, Ramona se pegou sorrindo: os cantos de seus lábios estavam erguidos de forma frágil e trêmula, resultados do afeto que sentia pela mulher que dominou seus pensamentos mesmo num momento sombrio. Fechando as pálpebras, a jovem tentou se focar no momento. Aquele não era a ocasião de pensar em Kathrina, aquela que estava atiçando seus desejos mais íntimos ultimamente. Se ela quisesse ter certeza que viveria mais um dia, precisaria sair dali e continuar caminhando.

Ainda arfando, Ramona retirou uma das mãos do ferimento — algo que fez mais sangue jorrar para fora do ferimento, já que a pressão dali suavizou — com um grunhido e a apoiou no tronco áspero da árvore. Com as pernas trêmulas, ela tentou se fincar no chão terroso e desuniforme, para então começar a afastar as costas do seu apoio. Assim que se percebeu em pé, ela abriu os olhos e se deparou com uma escuridão levemente semelhante com a de um cômodo sem iluminação. Se ela conseguia ver um pouco do caminho e de algumas plantas, era por causa da lua que brilhava com intensidade e solidão no céu, já que aquela era a única luz que existia por ali. Nem mesmo as estrelas pareciam estar acompanhando a tragédia que aconteceu com a descendentes dos Wolf.con

Tensionando os lábios para impedir-se de fazer algum som, ela deu um passo pra frente. A náusea subiu pela seu pescoço e se firmou no fundo da garganta, e pontinhos negros dançaram pela sua visão quando o calor em seu ferimento aumentou, fazendo a dor escalar pela lateral do seu corpo. A pressão em seu peito retornou, a forçando a abrir a boca, numa tentativa de colocar ar para dentro dos seus pulmões sufocados. Mesmo com tudo isso que se passava pelo seu corpo, Ramona deu mais um passo à frente.

Dessa vez ela sentiu um líquido quente escorrer pelo rosto, que fazia com que seus olhos ardessem — e percebeu que tinha acabado deixado algumas lágrimas escaparem. A sua visão tinha sido completamente dominada pelas sombras, o que a fez perceber que tinha novamente fechado as pálpebras. A dor que sentia era tanta, que sequer conseguia formar um pensamento. E, ainda assim, ela deu mais um passo à frente. E mais um. E mais outro.

Ou talvez não tenha dado mais nenhum, porque depois daquilo sua consciência simplesmente desapareceu.

[—]

O crepitar de uma fogueira não muito distante de si foi a primeira informação que a mostrou que estava novamente acordada. Ela franziu as sobrancelhas ao perceber que a dor que sentia na lateral do corpo estava muito mais suave do que antes, algo que a deixou confusa. Sentimento que passou rapidamente, já que logo pode sentir a mistura de aromas intensos doces e refrescantes, algo que costumava associar com ervas medicinais. Conseguia sentir que estava deitada em algo macio e que um tecido almofadado cobria seu corpo, a mantendo aquecida. Isso a fez pressionar as pálpebras, que sentia estarem pesadas, desejando as abrir o mais rápido possível para ver e se certificar do que estava suspeitando.

— Já entendi que você está acordada — A familiar voz grave, que normalmente continha um tom rude, soava resignada. No momento em que a ouviu, Ramona sentiu seu corpo relaxar onde estava deitada, assim como os cantos de seus lábios se erguendo num sorriso satisfeito. — Não tente abrir os olhos ainda, precisa descansar.

Mesmo que Kathrina estivesse tentando fingir casualidade, era perceptível para si que a outra estava preocupada. Por mais que a feiticeira tentasse negar, era óbvio que Ramona era alguém que ela considerava como uma amiga. O calor que dominou seu peito nesse momento era confortável, diferente da sensação de ser escaldada internamente que seu ferimento tinha lhe causado antes. Ela escutou um som de insatisfação vindo da outra, não demorando muito para escutar a voz alheia.

— Não sei do que você tá sorrindo — A reclamação feita naquele tom deixou bem evidente o sentimento de raiva que Kathrina estava sentindo no momento. — Se eu não tivesse te achado, você teria morrido no meio da floresta.

Mais uma vez, Ramona franziu as sobrancelhas. A pontada de dor que sentiu dominar seu peito nada tinha a ver com o ferimento que tinha recebido. Milhares de palavras e frases rodopiaram por sua mente, que estava intencionada a confortar a outra, e até mesmo chegou a partir seus lábios para pô-las para fora — todavia, a feiticeira não a deixou sequer fazer um som.

— É melhor você ir dormir.

O som resignado na voz alheia trouxe um aperto em sua garganta, travando tudo o que pretendia dizer para Kathrina. A descendente dos Wolf podia estar sem enxergar naquele momento, ainda assim, não precisava ver para perceber que a mágoa que se apossou de sua salvadora. Resolvendo que não deveria chateá-la ainda mais, Ramona seguiu o conselho dela e deixou o sono consumir sua consciência sem hesitação.

[—]

A segunda vez que acordou, suas irises turquesas enxergaram o teto amadeirado da humilde casa da feiticeira. Foi com uma breve confusão que percebeu que o tecido que tinha obscurecido sua visão tinha sido retirado de sua face. O aroma adocidado que adentrava em suas narinas era suave, o que indicava para si que já tinha se passado bastante tempo desde que tinha sido resgatada pela outra. Ramona não sentia dor nenhuma em seu tronco ou em qualquer outra parte do corpo; o efeito das ervas medicinais ainda estava funcionando pelo visto. Ao virar o rosto para os lados, sequer pode observar a cabana em que morava Kathrina, porque seus olhos fixaram-se rapidamente na figura dela sentada na cadeira ao seu lado, com as pálpebras fechadas.

O jeito sutil que o peito da feiticeira subia e descia mostrava que ela estava dormindo — a quanto tempo, era algo que não daria para saber. Sua cabeça estava pendendo levemente para o ombro, um detalhe que lhe fez torcer seus lábios em desaprovação. Sabia que era alguém desqualificada para ajudar a outra, no entanto, isso não significava que sentiria confortável vendo dormir numa posição tão incômoda. A descendente dos Wolf seria consumida pela culpa de a ter preocupado desse modo se Kathrina acordasse com uma dor no pescoço… Será que deveria acordá-la? Ou era melhor deixá-la descansar, já que com certeza tinha passado a madrugada tendo de cuidar do seu ferimento?

Distraída como estava em seus pensamentos negativos, Ramona não viu quando a cabeça alheia acabou deslizando suavemente em direção ao próprio peito, para então cair com brusquidão e assustar a feiticeira de volta à realidade. As pálpebras se abriram com o susto, deixando as irises esverdeadas nubladas à mostra. 

— Pare de morder seus lábios — A voz grave, num tom grogue por causa do resquício do sono, dominou o ambiente silencioso. O coração da ex-escudeira falhou uma batida, acelerando com intensidade ao que ela virava seu rosto em direção ao som. — Vai acabar se machucando e não vai ser eu quem vai cuidar disso.

— Perdão…

As sobrancelhas de Kathrina franziram-se.

— Por que você está me pedindo desculpas?

A descendente dos Wolf desviou seu olhar de sua salvadora, observando agora o lençol branco que cobria seu corpo. Dependendo de como responderia, tinha noção de que não seria a resposta que mais agradaria a feiticeira, por mais verdadeira que fosse. Mesmo assim, acabou deixando as palavras escaparem de si sem as filtrar devidamente.

— Por ter te feito se preocupar comigo durante a noite toda — Sua língua passou pelo lábio inferior, sentindo-o ressecado. Seu timbre era baixo, de forma que teve de tossir brevemente para ver se conseguia falar com mais clareza. — Sei que devo ter te assustado, mas quando me machuquei a única pessoa que me veio à cabeça foi você.

Ao escutar o grunhido revoltado de Kathrina, seus ombros se encolheram. Ramona não queria decepcioná-la, todavia era bem capaz que tivesse acabado de ter feito isso. Talvez estivesse aproveitando-se demais da boa vontade da outra. Seria melhor ela ir embora dali no momento em que estivesse recuperada o suficiente para andar…? Ao tentar traçar seus próximos passos, a ex-escudeira sentiu a ponta de dedos alheios tocando em sua face. Sem resistir, ela seguiu em direção ao que estava sendo guiada, até que suas irises turquesas estivessem encarando semelhantes esverdeadas.

A expressão no rosto da outra era negativa: suas sobrancelhas continuavam franzidas, de um jeito que fazia o nariz dela enrugar com sutileza, e um tom rosado estava estampado em suas bochechas — definitivamente pela raiva que ela estava sentindo. A descendente dos Wolf chegou a morder o lábio inferior diante do rosto da mais nova, entretanto logo sentiu o indicador da feiticeira passando por eles, o soltando de seus dentes dianteiros com um olhar semicerrado. O formigamento que sentiu naquela parte de sua boca foi intenso; por um momento seus olhos voltaram-se para a parede de madeira da cabana, voltando logo após para a figura à sua frente.

— Eu não quero que peça desculpas por se apoiar em mim — Cada palavra que Ramona escutava tinha sido dita pausadamente, num tom firme que não trazia dúvidas ou aceitava debates. A face de Kathrina foi se suavizando, até que estivesse em sua habitual carranca desagradada. — Na verdade, fico feliz que tenha feito isso. Principalmente por confiar que eu iria ao seu encontro ao te perceber na floresta.

Seu peito pesava com as intensas batidas cardíacas, no entanto, ela não sentia nenhuma dor. O efeito do remédio era realmente bom, mesmo que não fosse o suficiente para aliviar as reações que seu corpo tinha diante de sua salvadora. A ex-escudeira se manteve quieta, não sabendo como responder. Vendo isso como um sinal, a feiticeira continuou:

— O que eu quero é que você pare de minimizar e ignorar o que te acontece para evitar que eu me preocupe — Quando Ramona entreabriu os lábios para comentar sobre isso, a mais nova lhe lançou um olhar desagradado que a fez os fechar novamente. — E que seja mais gentil consigo mesma. Será que pode tentar fazer isso?

A intensidade das irises esverdeadas que a analisavam era alta. Uma leve pressão existia em seu rosto, onde Kathrina o segurava por entre suas mãos; eram quentes, macias na palma e tinham pequenos calos ao longo dos dedos. Embora fosse difícil — e desconfortável — tentar não cair nesse ciclo de autodepreciação, seria pior ainda perder a outra por não conseguir se esforçar para ao menos tentar mantê-la ao seu lado. Decidida a continuar aquele relacionamento, a descendente dos Wolf assentiu, fraca.

— Sim… posso tentar.

Ela observou as curvas dos lábios alheios se erguerem imediatamente, se posicionando num belo sorriso satisfeito. Com certa hesitação, acabou refletindo o gesto em direção a outra, incerta se seus esforços iriam resultar em bons resultados. Os dedos da feiticeira afagaram suas bochechas, num carinho tenro que trouxe um tom rosado em sua face.

— É tudo o que eu queria — Kathrina sussurrou, aproximando seu rosto a fim de que suas irises estivessem bem fixadas uma na outra. — Agora preciso que você volte a descansar, podemos conversar sobre o resto mais tarde.

Ainda que não se sentisse cansada, Ramona assentiu de novo. Como estava em boas mãos, sabia que não demoraria para se recuperar — naquele momento, mesmo que lhe fosse explicado seu estado atual, duvidava que conseguiria o compreender. Por isso, confiando na feiticeira que a tinha salvo, a descendente dos Wolf mais uma vez tornou a fechar suas pálpebras, permitindo-se, dessa vez, um descanso.

Notes:

e é isso, espero que tenha gostado !! bom femslash february pra você e qualquer coisa meu tumblr tá aqui !!

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